Por Abdon Marinho
Olho para trás, até onde a vista alcança é a memória não trai, numa retrospectiva dos escândalos nacionais, e em todos (ou quase), o que se ver é o envolvimento da nossa classe política. Não tem uma operação policial que não tenha o envolvimento, ainda que indireto, de um vereador, prefeito, deputado, governador, secretário, ministro, etc. Cada vez mais e com mais frequência, a corrupção invade nossas salas, nossas casas, nossos locais de trabalho. É algo aterrador.
O que me pergunto é desde quando é assim? Será que sempre foi desta forma e as coisas apenas estavam mais mascaradas? Acho que não. Acho que de uns tempos para cá começou a haver uma degeneração onde o errado passou a ser o certo é o certo o errado. As pessoas honestas sentem vergonha se serem honestas. A sociedade parece que conformou-se com esse tipo de coisa.
Leio num site que um novo dilema toma conta dos lares brasileiros: os pais têm dúvidas se ensinam princípios éticos aos filhos. Temem que os tenham tais princípios sejam prejudicados numa sociedade em que a sociedade cultiva o hábito de se levar vantagem em tudo. A ética seria um péssimo atributo. Vejam onde chegamos. Mas isso vem se solidificando na sociedade faz tempo. Os políticos são reflexos e não espelhos deste novo padrão. A sociedade acha que o político honesto, com princípios éticos são “bestas”, que eles devem levar vantagem dos cargos que ocupam, como se dizem, “tirar o seu”, dizem isso com tanta naturalidade que chego a desconfiar não serem os corretos, de fato, “bestas”. Um amigo eleito para um cargo, cerda vez foi indagado: “fulano, com esse cargo, consegues “tirar” quanto? Um outro outro amigo que já ocupou cargo público disse-me que no seu mandato fez tudo certo, o mais perfeito que se poderia exigir, entretanto caso volte algum dia a ocupar um cargo público fará tudo diferente, fará tudo conforme o “normal” dos dias de hoje. Justificou: aos olhos da sociedade estamos todos na vala comum, com o agravante de que o corrupto tem o poder do metal para se safar melhor do que eu que procurei fazer tudo certo. Tenho um outro amigo que diz se sentir angustiado quando alguém o apresenta informando o cargo que ocupa.
O quadro de desalento me levar a refletir sobre que futuro espera uma sociedade onde os pais temem educar seus filhos dentro de padrões éticos, ensinando-os que é errado fazer o errado para tirar vantagem. Como é possível fazer prosperar uma nação onde o jeitinho toma o lugar do correto? onde ser honesto é motivo para punição e não para reconhecimento? Onde os políticos de bem (os poucos que restam) se sentem mal em serem reconhecidos como políticos ou como homens de bem?
Já disse neste mesmo espaço em outras oportunidades que vivemos uma espécie de degradação moral da sociedade da política em especial. Nunca se tornou tão presente o fato da representação da população ser feita por pessoas que tem no mandato um negócio.
Nas próximas eleições teremos o coroamento deste modelo. não haverá representação ideológica, a não ser a exceção da exceção. O quadro que se desenha é de deixar qualquer um com um mínimo de pudor, envergonhado e triste. De lado a lado há um pragmatismo tacanho e nojento. Para constatar isso não precisa de muito esforço, apenas ver com quais jogadores cada time vai jogar. Iremos constatar que pessoas que sequer deveriam frequentar livremente os lugares públicos se insinuam para serem representantes do povo, escudados no poderio econômico e político muitos destes serão eleitos. Muitos ainda ousam dizem que são pessoas de bem, que estão na boa causa. Pessoas que nunca deram “um prego numa barra de sabão”, de repente aparecem como postulantes a representação política. O pior de tudo isso é muitos contam com o apoio ou devo dizer cumplicidade, de quem deveria extirpar esse tipo de pessoa da vida pública. Hoje já vemos jornalistas e políticos defenderem diversos nomes para cargos públicos, deputados estaduais e federais. Os que não se elegerem serão agraciados com sinecuras na máquina pública para continuarem a fazer o fim a que se destinam.
Sempre me pergunto: Como é possível que a sociedade não ache esquisito que determinado político gaste muito mais com sua eleição que os salários que irá perceber durante os quatro anos? Como fazem para fechar as contas se o cargo público só paga 100 e ele gastou 500 para se eleger? Será que ninguém ver que o negócio não é licitamente vantajoso e que há algo de muito errado nisso? Como posso achar normal que alguém possa apresentar como credenciais para disputar um mandato eletivo o fato de ser filho, esposa, sobrinho, parente ou aderente de fulano ou sicrano? Como posso aceitar que trata com naturalidade o fato de alguém se propor candidato escudado no poderio econômico do desta ou daquela pessoa? Como posso achar normal que partidos e candidatos aceitem em suas fileiras pessoas de passado duvidoso porque este possuem recursos, muitos recursos, estes nem sempre adquiridos de forma honesta? Como posso achar normal que a imprensa, o quarto poder, tida como os olhos da nação silencie ante este ataque a normalidade democrática e até endosse certas candidaturas?
A caso não sabem o mal que causam a nação? Não seriam, na verdade cúmplices?
Sei que tem pessoas sérias na política. Ainda vejo muitos querendo fazer a coisa correta. Estes são bem poucos e a cada eleição seu número é reduzido cada vez mais. Nas próximas eleições é capaz não escaparem muitos, se escapar algum.
Abdon Marinho é advogado eleitoral.