A Viação Primor foi condenada a pagar indenização, por danos morais, no valor de R$ 2 mil, e por danos materiais, a serem apurados, a um passageiro assaltado dentro de um veículo da empresa em São Luís. O entendimento que levou à decisão unânime da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA) é de que, no contrato com seus passageiros, a empresa de ônibus fica obrigada, como contraprestação do pagamento das passagens, a dar-lhes segurança, mantendo-os ilesos até o destino final.
O passageiro ajuizou uma ação de indenização por danos morais e materiais, demonstrando, por meio do boletim de ocorrência e depoimentos de testemunhas, que foi assaltado no interior de um veículo da Primor e que teve objetos pessoais roubados. Depois de ter seu pedido negado em primeira instância, ele apelou ao Tribunal de Justiça.
Em sessão anterior, o desembargador Marcelino Everton (relator) inicialmente entendeu que, embora o apelante tenha demonstrado que fora vítima do assalto, a empresa não teria dado causa ao fato, eximindo-a da responsabilidade, caracterizando fato de terceiro.
Ele citou o Código de Defesa do Consumidor e fatos semelhantes julgados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e pelo TJMA, que consideraram assalto no interior de ônibus como causa excludente da responsabilidade da empresa.
PEDIDO DE VISTA – A fim de melhor apreciar a matéria, o desembargador Jaime Ferreira de Araujo pediu vista do processo na sessão passada. Depois de consultar detidamente os autos, o magistrado ficou convencido de que, realmente, o apelante fora vítima de assalto dentro de um dos veículos da Primor, constatação feita por depoimentos de testemunhas da própria empresa, bem como do boletim de ocorrência.
Analisando o tema sob o ponto de vista da lição de Luiz Guilherme Marinoni, na obra “Tutela Contra o Ilícito”, Jaime Araujo citou trecho em que o autor diz que, para chegar ao fato objeto de prova (fato probandum), o juiz parte de um indiciário e, como também para valorar a credibilidade de uma prova e a sua idoneidade para demonstrar um fato, baseia-se em sua experiência.
Ao ressaltar não restar dúvida de que o apelante foi vítima de assalto dentro do ônibus, o desembargador disse que se caracterizam, desse modo, os elementos da responsabilidade civil: conduta, nexo de causalidade e resultado danoso.
Jaime Araújo entendeu, portanto, que a empresa deve arcar com todos os danos suportados pelo passageiro, pela obrigação de dar-lhe segurança, além de que o contrato se enquadra como uma relação de consumo, tornando-se desnecessária a comprovação de culpa da empresa, devendo esta responder pelos danos causados aos seus passageiros, mesmo que causados por terceiro, como ocorreu no caso.
O desembargador observou, ainda, que os assaltantes ingressaram no transporte coletivo como se fossem passageiros deste, o que deveria ter sido evitado pela empresa, caso estivesse fornecendo um transporte seguro.
Acerca do tema, Jaime Araujo citou lição de Sérgio Cavalieri Filho, na obra “Programa de Responsabilidade Civil”, segundo o qual, “a obrigação do transportador não é apenas de meio, e não só de resultado, mas também de segurança”.
O magistrado elencou vários precedentes de tribunais de outros estados e do STJ, que consideraram não poder ser enquadrada como caso fortuito a situação em que o assaltante ingressa armado no ônibus, viajando por horas como passageiro normal, tendo se tornado fato comum e corriqueiro, sobretudo em cidades e zonas tidas como perigosas.
Lembrou que um dos julgados do STJ guarda estreita semelhança com a questão discutida pela 4ª Câmara Cível.
Jaime Araújo entendeu que a Viação Primor deve arcar com todos os prejuízos, tanto a título de danos materiais, referente ao valor do celular roubado – a ser apurado na liquidação da sentença – quanto a título de danos morais. Em relação a este, arbitrou o valor de R$ 2 mil, considerando os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
O relator Marcelino Everton ajustou seu voto, nos termos do que foi proferido pelo desembargador Jaime Araujo, entendimento acompanhado pelo desembargador Paulo Velten, que, desde a sessão anterior, havia levantado a questão da necessidade de as empresas de transporte conduzirem seus passageiros com toda a segurança, levando em conta que não se pode considerar o caráter da imprevisibilidade em situações em que é possível prever. (Protocolo nº 26638/2017 – São Luís)