Por Milton Corrêa da Costa
Custei aacreditar no que ouvi no rádio do carro de um amigo, na noite deste domingo, 29 de janeiro, no trajeto do bairro do Jardim Botânico para minha residência na Tijuca, no Rio. Era um desabafo, apimentado por ofensas com palavras de baixo calão, proferido pela famosa cantora Rita Lee, durante o show de despedida dos palcos que realizava em Aracaju, na Barra dos Coqueiros, no último sábado.
Inconformada, segundo ela pela truculência de policiais que faziam segurança no local contra seus fãs, Rita Lee extrapolou em suas palavras publicamente. A cantora foi detida por ter chamado os policiais que faziam a segurança no local de “cachorros” e “filhos da puta”. O vídeo mostra Rita Lee acusando os policiais de truculência contra os fãs e afirmando não ter medo por “ser do tempo da ditadura”. “Esse show é meu, não é de vocês. Esse show é minha despedida do palco e vocês continuam tendo de guardar as pessoas e não tendo de agredir, seu cachorros”, disse a cantora, conforme publicado na mídia.
O delegado Leogins Correa, da Delegacia Plantonista de Aracaju, afirmou que, em seu depoimento, Rita Lee alegou ter agido pelo calor da emoção e por ter considerado truculenta e desnecessária a ação dos policiais com seus fãs. Segundo o delegado, ela citou como testemunhas a ex-senadora e vereadora de Maceió, Heloísa Helena (PSOL-AL), e a deputada estadual do Rio de Janeiro, Janira Rocha, que estariam presentes no show.
Com todo respeito ao enorme talento e à brilhante carreira da referida cantora e compositadora que elevou aos píncaros da glória o estilo diferenciado do rock brasileiro, não lhe cabia tal atitude tão agressiva. Se tivesse considerado, naquele instante, que a ação policial era desproporcional e desacabida- o inquérito policial irá apurar todo o fato e a origem da intervenção- Rita Lee não tinha, por outro lado, o direito de cometer grave injúria (pública) contra os policiais que ali se encontravam. Como líder de várias gerações, a começar, em pleno regime ditatorial, pela irreverência dos inesquecíveis “OS MUTANTES”, Rita Lee não precisava, em sua despedida dos palcos, ter agido com tanta emoção e impulsividade. Poderia ter feito o uso moderado das palavras para repelir o que considerava injusto.
Rita Lee, sem se dar conta, com suas ásperas e deseducadas palavras, movida não pela razão mas pela emoção incontida, feriu o Código Penal Braileiro, onde todos, em princípio, devem ser iguais perante a ele. Poderia, inclusive, ter dado origem a um conflito de proporções inimagináveis, onde suas tórridas palavras poderiam ter se transformado como forma de incentivo ao grande público para voltarem-se contra os próprios policiais. Vale acrescentar que onde tem show musical, com a presença de grande público, há a presença de álcool e muito comumente hoje também de energéticos, não consumidos necessariamente no espaço delimitado para o show, mas momentos antes que ele se inicie, no espaço extra muros, em bares, quiosques ou até mesmo nos lares antes da saída para o divertimento.
Rita Lee, com seus mais de 40 anos de carreira de sucesso na música brasileira, de canções memoráveis, haverá agora, pós-acidente, de proceder a mea culpa. Terá que se desculpar do auê, dizer que “não queria magoar”, como tão bem retrata na letra da música de sua autoria “DESCULPE O AUÊ”.
A reação desproporcional e impensada, de desequilíbrio momentâneo, movida pela forte emoção, são comportametos injustificáveis contra um ato contra o qual não concordamos, quanto mais publicamente, onde a caracterização da injúria grave ficou comprovada com todas as letras. Ninguém está acima da lei. Nem os grandes músicos, autoridades e celebridades. A regra, no estado democrático de direito, é que a lei é igual para todos. Pelo menos deveria ser. A vida é uma constante reciclagem nobre Rita Lee, mesmo após os 60 anos de longa estrada.
Milton Corrêa da Costa é estudioso e pesquisador em violência urbana