Por Antonio Noberto
Faz alguns anos, em um programa de shows de uma emissora de TV cearense, ouvi uma declaração do famoso cantor Jerry Adriani. Confesso que ri muito ao ouvir as palavras de indignação do veterano artista, mas o desabafo do ícone da Jovem Guarda é mais para chorar que para rir. Ele dizia ao apresentador que, antes de realizar um show em uma capital do Centro-Oeste, um rapaz perguntou a outro se “Jerry & Adriani era uma dupla sertaneja!”. Adriani perdeu as estribeiras com a ignorância do rapaz e concluiu que no Brasil são pouquíssimos os cantores que ficam na mídia. O resto, a imensa maioria, permanece esquecido, sem apoio algum.
A música nacional ganhou o mundo. A composição do mineiro Ary Barroso Aquarela do Brasil e a magistral obra de Vinícius de Moraes e Tom Jobim Garota de Ipanema são macros exemplos da qualidade das músicas nacionais e, por isso, tornaram-se “patrimônios da humanidade”. E tantas outras maravilhas que são orgulho nacional e contribuem para a diversidade dos nossos gêneros musicais e ritmos genuínos que tornam ímpar a cultura do país.
Muitas das unidades da Federação conseguiram romper a barreira regional e firmaram nacionalmente ao menos um gênero musical. No sentido anti-horário do mapa, destacamos o samba do Rio de janeiro, de raízes africanas, uma das nossas principais marcas, que originou a Bossa Nova em fins dos anos cinqüenta; o Axé baiano, também de origem africana; o Frevo pernambucano; o baião (derivado de baiano) que teve como maior ícone Luiz Gonzaga; o forró cearense; e o carimbó paraense – de origem indígena com influência africana, sendo que a lambada tem origem no carimbó.
Observamos que do Ceará pula-se para o Pará, e o Maranhão não aparece como lócus dos grandes gêneros musicais. Os próprios cantores maranhenses, não obstante o valor, com raras exceções, não conseguem transpor as fronteiras regionais, e mesmo quando conseguem, não frenquentam assiduamente a grande mídia. O que pode parecer falta de talento e incompetência dos nossos artistas é, na verdade, o resultado da carência de racionalização do produto cultural maranhense, que necessita de política dedicada a este segmento cultural. Talento não falta aos nossos cantores. É só observarmos ao redor e constataremos uma verdadeira legião, que vai desde artistas de renome, já consagrados nacionalmente, a outros também de muita competência, que ainda não receberam o devido reconhecimento, mas que não desistem de buscar um lugar ao sol. Assim, mencionamos Alcione, Zeca Balero, Antonio Vieira e João do Vale (ambos in memorian), Fernando de Carvalho, Cesar Nascimento, Teresa Cantu, Rita Ribeiro, Renata Gaspar, Roberto Brandão, Gabriel Melônio, Papete, Nonato Buzar, Chico Maranhão, Josias Sobrinho, Gabriel Melônio, Alê Muniz e Luciana Simões, Edilson Gusmão e Adão Camilo; Jailson Pereira, Vicente Melo e César Barata; Rose Maranhão e Célia Maria; Cláudio Pinheiro; Jhota Jr. e Gilvan Mocidade, Lairton, Gonzaga Junior, Adelino Nascimento (in memorian), Claudio Fontana, Flávia Bittencourt, Fernanda Garcia, Julio Nascimento, Silvio Max, Chico Cesar, Carlinhos Veloz, Roberto Ricci e muitas bandas e grupos que fazem muito sucesso nos mais diversos recantos do estado e do país.
Alguns destes artistas não necessariamente nasceram no Maranhão, outros residem em outros estados, mas tem em comum a carreira de sucesso em solo timbira. Muitos tiveram composições gravadas por personalidades nacionais como Beth Carvalho, Maysa, Elis Regina, Maria Betânia, Alcione, Elizeth Cardoso, Luiz Gonzaga, Caubi Peixoto, Nelson Gonçalves, Ivan Lins, Milton Nascimento e tantos outros. Roberto Ricci, por exemplo, com a ajuda da Marrom, foi muito aplaudido no prestigiado Programa do Jô Soares. É personagem do romance que publiquei em 2007 intitulado Só por uma estação: uma viagem ao Brasil. Muitos maranhenses não imaginam o poder de muitos destes e outros cantores em arrebatar multidões. Julio Nascimento, natural de Colinas, com sua Leidiane, lota os espaços por onde passa e, ao final das apresentações, sai recolhendo as calcinhas e sutiãs arremessados pela mulherada apaixonada. E não é só ele, é grande o rol de cantores apaixonados e apaixonantes.
Não esquecemos também dos cantadores, aqueles ligados às manifestações populares, cantadores de boi como Coxinho (in memorian), Donato, João Chiador, Humberto Maracanã, Apolônio, Chagas e toda uma nova safra de muito valor que vem despontando. Os cantores gospel também não ficam devendo. Tem cada vozeirão de arrepiar.
Sabe aquela impressão que a gente tem quando sai de um lugar e fica a sensação de que esqueceu de levar alguma coisa, pois é, é a que estou sentindo agora. Na verdade tenho a convicção de que estou esquecendo de mencionar muita gente boa, que manda ver e faz a cultura deste estado ser tão rica de ritmos e estilos musicais. Antecipadamente peço que aceitem minhas sinceras desculpas.
O problema declinado por Jerry Adriani no início deste texto deve ser um combustível a mais, um velho novo desafio aos muitos mestres da nossa música popular maranhense ainda não reconhecidos pela crítica. Eles não desistem porque sabem que não existe melhor feedback que uma multidão vibrando e aplaudindo. É este reconhecimento do público maranhense que faz do estado um grande e promissor celeiro de belas vozes e melodias.
A gente se vê!
Antonio Noberto
Pesquisador, membro do Conselho Diretor da Aliança Francesa de São Luís.
Obrigado por me propocionar essa viagem.
Olhe! Que texto. Maravilhoso!
Eu gosto muito dessa música (Já ouvi por aí) porém não consigo encontrar o áudio da mesma.
Obrigado!
Hj um marenhense que merece destaque é o Gui Lopes.
Com mais de 400 musicas, este ano representantara novamente o Brasil na Beatleweek em Liverpool.
Faltam realmente políticas públicas nesse sentido.