Por Milton Corrêa da Costa
Na tarde de 14 de janeiro do ano passado, na Avenida Infante Dom Henrique, em Botafogo, Zona sul do Rio, quando na condução de um ônibus da Linha 433 ( Leblon- Vila Isabel), o motorista Denivaldo de Melo morreu repentinamente de infarto, perdendo o controle do veículo que conduzia, tendo subido a calçada e atropelado quatro pessoas num ponto de ônibus. Recentemente, na Zona Leste de São Paulo, o motorista de ônibus Edilson dos Reis Alves, de 59 anos, envolveu-se em um acidente tendo o coletivo abalroado quatro carros e uma moto. Foi acometido de um princípio de infarto ao volante. H´´a depoimentos que o motorista ainda puxou o freio de mão do ônibus. Não morreu do mal súbito, mas linchado por motoristas e populares que deixavam um baile funk nas proximidades. Imaginava-se que a vítima, morta pela brutal e insensata agressão, estivesse dirigindo bêbado.
Em maio de 2008, no bairro da Tijuca, Zona Norte do Rio, um motorista, soube-se posteriormente que era portador de esquizofrenia paranoide, ainda que habilitado para conduzir, agrediu, numa discussão de trânsito, com uma barra de ferro, a cabeça de outro motorista, tendo este adquirido, ad eternum, graves lesões cerebrais. Um psicótico a solta no trânsito. Foi processado e condenado, mas ao que tudo indica encontra-se em liberdade, devendo, no máximo, em razão da doença mental, ser recolhido, como medida de segurança, a manicômio judiciário, tal e qual o jovem que recentemente roubou um ônibus num terminal rodoviário, na Barra da Tijuca, no Rio, e o conduziu perigosamente por mais de 20 km, tendo, no trajeto suicida, colidido com vários veículos, sendo detido posteriormente pela polícia após uma perseguição cinematográfica.
Nem só de más notícias porém vive o trânsito brasileiro e a Lei Seca é exemplo de boa e eficaz medida que tem poupado vidas e evitado tragédias. Assim é que, nesta semana, foi apresentada, de forma oportuna, durante um congresso médico, em Brasília, uma diretriz conjunta ( a primeira do ramo) entre a Associação Brasileira de Medicina de Tráfego e a Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas, que visa orientar em que condições pessoas com os chamados dispositivos cardíacos implantáveis, como marca passos, desfibriladores e ressincronizadores cardíacos, poderão dirigir carros e tirar ou renovar a carteira de motorista. Será especificado, por exemplo, o tempo ideal que um paciente submetido a uma cirurgia para implante de marca passo ou para a troca do gerador do dispositivo deve esperar para voltar a dirigir.
A tendência é que o texto vire uma resolução do Conselho Nacional de Trânsito. A diretriz recomendará ainda que os portadores de desfibriladores cardíacos, dispositivos que tratam um tipo de arritmia que pode causar morte súbita, e ressincronizadores cardíacos, aparelhos usados em pacientes com alguns tipos de insuficiência cardíaca, fiquem impedidos de dirigir profissionalmente, embora possam, sob condições, dirigir carros particulares. Segundo o diretor-científico da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego, Flávio Adura, cerca de 4% dos acidentes fatais são causados por doenças do motorista. “Os problemas cardiológicos são uma das principais causas de mal-súbito”. Cerca de 37 mil brasileiros têm marcapassos, desfibriladores ou ressincronizadores cardíacos.
Estamos, portanto, a mercê de inúmeros homens- bombas, na condução do transporte coletivo ou particular em vias públicas. Muitos motoristas de coletivos, que transportam diariamente milhares de seres humanos, sequer sabem que são hipertensos e/u cardíacos. As pesquisas indicam, por exemplo, que no Brasil mais de 15% de seus habitantes sofre de hipertensão, fonte do infarto e do acidente vascular encefálico. Neste percentual, obviamente, estão incluídos um bom número de motoristas de ônibus e de carros particulares, alguns também com problema de obesidade mórbida, sem falar nos estressados do volante, dirigindo muitas sob forte tensão. Registre-se que o trânsito hoje, mormente nos grandes centros urbanos, é fonte de estresse fato que acaba influindo no ato de conduzir seguramente um veículo. Se a temperatura ambiente for de intenso calor a situação de agrava, mormente quando sabemos, por exemplo, que a maioria dos veículos coletivos no Brasil não possuem ar refrigerado, o que causa desconforto, incômodo e mal-estar aos seus motoristas, dirigindo muitas vezes em condições sub-humanas em veículos antigos, em péssimas condições de manutenção.
Muitas tragédias podem ser evitadas no trânsito brasileiro. Basta prevenir, monitorar e fisaclizar. O exame psicológico, quando da renovação da CNH, para motoristas particulares, não só para os do transporte remunerado, deveria, por exemplo, ser medida obrigatória. Há psicopatas e doentes mentais ( o psicopata não é considerado doente mental mas é pessoa perigosa), além de pessoas portadoras de elevado grau de estresse e agressividade conduzindo no trânsito.
É preciso urgentemente também que as empresas de ônibus intensifiquem os testes de avaliação física e psicológica de seus profissionais. Caso contrário todos nós, usuários da vias públicas, estaremos em risco permanente. Tal ação preventiva deve ser prioridade das empresas de transporte coletivo e meta permanente da área de recursos humanos. A vida humana é o maior bem jurídico tutelado. Tais tragédias podem ser evitadas. Antes tarde do que nunca.
Milton Corrêa da Costa
Coronel da reserva da PM do Rio de Janeiro