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Um novo mensalão ?

Por Abdon Marinho

Abdon Marinho.

Em 2005 foi denunciado o esquema de compra de parlamentares pelos atuais donatários do poder. Investigações realizadas pela polícia federal, comprovou os crimes denunciados, levando o judiciário, através de sua instância máxima, o STF, a acatar a denúncia do ministério público e condenar mais de duas dezenas de políticos, empresários, banqueiros, corruptos de vários naipes.

Nos últimos dias os mesmos donatários do poder nos brindam mais um escândalo de grandes proporções, este, envolvendo, mais uma vez, o Congresso Nacional, mais precisamente o Senado da República. Primeiro fizeram o que podiam e o que não deviam para impedir a instalação da CPI, depois escolheram os integrantes “a dedo”, conduziram os trabalhos a não causar nenhum aborrecimento ao governo.

Apesar disso tudo, de todos os integrantes da CPI rezarem na cartilha do governo, tinham que ir além. Como se tornaram useiros e vezeiros no desrespeito as instituições republicanas, tinham que avacalhar o Congresso Nacional, fazendo com que senadores, depoentes, jornalistas, servidores e a população em geral, fizessem papel de bobos, enquanto gastavam horas e horas em depoimentos, que na verdade não passavam de uma encenação grotesca.

Embora, a primeira vista, pareça apenas um peça do teatro da depressão com a qual a política nacional nos assombra de tempos em tempos, acho que estamos diante de algo bem mais grave. O fato em si, já de gravidade ímpar – e embora vivamos em tempos de relativização da ética –, parece passar de qualquer medida que se desmoralize, a esse ponto, o Senado da República.

Estamos falando de senadores, representantes dos estados da federação que acordaram ou foram usados por integrantes do governo para simular uma investigação do Congresso Nacional, enganando os demais senadores, parlamentares e o povo brasileiro. Algo tão ou mais grave que a suposta troca de favores, as negociações espúrias, as mesadas pagas em troca de apoio nos primeiros anos da década passada.

Durante anos os executivos da Petrobras se gabaram de serem, os mais competentes, os mais capazes. Se são tudo isso, qua a necessidade de se valerem do instrumento da fraude para responder a uma comissão tão domesticada? Receber as perguntas com antecipação e, mais que isso, ensaiar com os técnicos, advogados, as respostas, não parece ridículo para executivos tão competentes? Colar é coisa que nem mesmo os alunos mais vagabundos da sétima série ainda fazem.

Na verdade, temos duas situações a merecerem atenção, a primeira que esses dirigentes da Petrobras, chamados de técnicos não devem ser tão competentes assim, se o fossem não se valeriam de expedientes tão sórdidos; a segunda, que o negócio que fizeram era de tal forma danoso aos interesses do país que só através de perguntas combinadas e respostas ensaiadas poderiam respondê-las. Em ambos os casos sobra a falta de postura dos que participaram da farsa.

Estamos as portas de eleições gerais. Em outubro escolheremos presidente, senadores, governadores, deputados federais e estaduais, representantes de poderes cujo papel a ser exercido de forma harmônica é a vigilância de um sobre o outro e não em conluio. E, contra os interesses dos cidadãos, montarem farsas.

Essa última estripulia dos donos do poder é um grave atentado a ordem institucional e a própria democracia e por isso merece rigorosa apuração e punição. Como é que o cidadão pode ir a urna escolher seus representantes se eles, ao invés de exercerem os papeis que lhe cabem, concordam com esse tipo de armação, com esse tipo de engodo? A leitura que se faz é que esses representantes têm os cidadãos que votam e pagam impostos a não mais poderem, na conta de arrematados otários. Mais, que eles quando estão no poder estão pouco ligando para a delegação de poder que receberam, por isso mesmo fazem qualquer tipo de negócio, inclusive gastar milhões e milhões em um teatro para ludibriar os eleitores que confiaram o mandato.
A comprovar-se o que está noticiado, significa que para os engendraram essa armação, não existe qualquer limite a ser ultrapassado, significa o desprezo total e absoluto pelas instituições e pela democracia que tentamos a todo o custo construir. Se no mensalão original as negociações, as compras de apoio se deram através de pessoas jurídicas de direito privado, os partidos políticos, nesta, o acontecido ocorre dentro de uma Comissão do Senado da República, seus artífices são senadores, executivos da maior empresa do Brasil, a Petrobras, servidores públicos dos mais altos escalões do Congresso e do Executivo. Todos agentes públicos, pagos pelos contribuintes para defenderem os interesses do país e que não poderiam, em hipótese alguma, coonestar com essas práticas. Não adianta o governo e seus xerimbabos tentarem dizer que não ocorreu nada demais, que é normal o que fizeram. Não é.

Por mais que se tente, não há outra palavra a definir o engodo, a farsa, o teatro que montaram que não crime. Um crime contra a democracia, um crime de lesa-pátria que o só o cinismo mais vergonhoso faz com que se ignore e se tente colocar “panos quentes”. Poucas vezes na história deste país de tantos exemplos desastrosos se viu submeter um parlamento a tamanha humilhação. Vivêssemos sob o império das leis, seus autores seriam expulsos dos cargos e mandatos pelas portas dos fundos, sujeitando-se ainda a passar uma boa temporada atrás das grades.

Infelizmente, no Brasil, ninguém liga, os mesmos que desrespeitam a democracia são eleitos e reeleitos inúmeras vezes, crimes viram meras “esperteza” e seus autores são recompensados e festejados.

Abdon Marinho é advogado eleitoral.

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